sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

AS VIRTUDES E OS MALEFÍCIOS CAUSADOS POR UMA MESMA COISA



KATSUJINKEN

Conta a lenda, que Masamune e Murasame eram dois famosos ferreiros, forjadores de espadas, que viveram no século XIV.

Murasame tinha um caráter violento e era inquieto; tinha uma reputação péssima por fabricar "espadas terríveis" com as quais eram travados combates sangrentos, que resultavam na morte dos combatentes. Suas armas, sedentas por sangue rapidamente ganharam fama de serem maléficas.

Ao contrário dele, Masamune era um forjador sério de grande serenidade e praticava um ritual de purificação para forjar suas espadas. Elas eram consideradas as melhores do país.

Um homem querendo averiguar as diferenças entre as espadas,  introduziu, numa corrente de água, uma espada de Murasame e, acima dela, soltou, na água, algumas folhas; cada folha que passava pela espada era cortada em duas.

Em seguida introduziu uma espada de Masamune e repetiu o procedimento. As folhas, que desciam a corrente, quando chegavam ao gume da espada, como que por encanto o contornavam e seguia rio abaixo, intactas.

A espada de Murasama, tinha o poder de cortar e destruir, a de Masamune tinha um poder também, mas não de destruição.

Logicamente a lenda não é verdadeira.

A espada japonesa foi, na verdade, inventada por Masamune, por volta do ano de 1270, quando os Mongóis tentavam, pela primeira vez, invadir o Japão. Até então, os Samurais travavam entre si, combates ritualísticos, montados a cavalo e usando uma espada longa, onde prevalecia a honra e o respeito. Já os Mongóis eram guerreiros ferozes, que não conheciam nem respeito, nem honra, guerreando de forma convencional e violenta. Para enfrentar tais oponentes, Masamune desenvolveu uma espada mais curta, porém afiadíssima, que pudesse ser usada por um Samurai em pé, e cortar as armaduras Mongóis, feitas de couro – a Kataná.

Da lenda, porém, nasceram os conceitos de SATSUJINKEN e KATSUJINKEN; o primeiro, representa o combate sangrento, onde a espadada é destrutiva e tem o espírito da morte; já no segundo, a espada é construtiva e tem o espírito da vida; representa o combate onde a vida é preservada.

KATSUJINKEN, em síntese, significa vencer um combate de espada, sem ferir o oponente.

Simbolicamente, os conceitos representam a ideia de que, uma mesma coisa pode causar efeitos muito diferentes, dependendo de como é usada; não só espadas, mas uma gama infinita de coisas.
A água límpida e cristalina, que mata nossa sede e é a base da vida na Terra, pode facilmente, matar alguém afogado.

A informática, com seus múltiplos aplicativos, pode ser uma grande ajuda para a maioria das pessoas, mas seu uso excessivo pode causar dependência e alienar as pessoas, prejudicando vários aspectos de suas vidas.

As religiões, que trazem alento e conforto para muitas pessoas,    foram a causa das mais sangrentas guerras da história.

Como sempre, a vida e o Aikido se confundem, sendo, as vezes, difícil separar um do outro.

Eu não conheço melhor exemplo, para demonstrar estes conceitos, do que o Aikido. Com ele, podemos tanto ferir um oponente, como simplesmente interromper um conflito, não causando, ao agressor, qualquer tipo de dano.

O melhor exemplo disso, está nas palavras de Ô Sensei, o Fundador, quando se referia aos princípios básicos de sua arte marcial: “... é com base nesses princípios que posso, matar com um só golpe, ou, simplesmente, interromper o conflito e exigir a paz...”.


Assim, com sabedoria e consciência, cada vez que for utilizar alguma coisa, reflita sobre qual a melhor maneira de fazê-lo.

terça-feira, 1 de novembro de 2016

Adeus,Pai! - 26/10/2016



O CICLO DA VIDA

O corpo de todos nós contém grandes quantidades de elementos químicos armazenados, obtidos da Terra. Esses elementos nos são emprestados pelo prazo de nossas vidas; após a morte, esses elementos devem voltar à Terra para serem utilizados por outras formas de vida, que estão à espera.
Contudo, nosso corpo não é formado apenas por matéria; em seu interior, há uma espécie de luz, um brilho, que alguns chamam de alma, outros de espírito, enfim, uma centelha divina, que define aquilo que realmente somos, e que, um dia, acaba por se libertar da prisão de um corpo velho e cansado.
Esta luz, acaba por tocar as pessoas vivem próximas, deixando sua marca indelével, que nos cativa, conquista e, por fim, nos influencia, inspira e modifica.
Assim, meu pai, devolva agora à Terra os elementos químicos emprestados; mas onde quer que esteja, jamais deixe esta sua luz parar de brilhar.
Saudades.


sexta-feira, 21 de outubro de 2016



LEVAR VANTAGEM

Desde que, em 1976, o jogador da Seleção Brasileira da copa de 70, Gerson, fez um comercial de cigarros onde dizia “o importante é levar vantagem. Certo?”, a expressão “levar vantagem” passou a ter o estigma negativo de se agir de modo a obter vantagens em qualquer situação, sem se importar com questões éticas ou morais. Era a “lei do Gerson”.
Era o ganhar sempre, mesmo que para isso, fosse preciso prejudicar os outros.
Seguramente isto foi fruto de uma parcela da população, de mente mais obtusa, que ajudou a propagar essa ideia enganosa sobre o ato de levar vantagem.
Levar vantagem, não implica, de forma alguma, em enganar ou prejudicar os outros, nem agir contra a ética ou a moral.
Cito como exemplo, um conselho que dou à minha filha: se você estudar bastante, enquanto seus coleguinhas ficam caçando Pokemons, você vai levar vantagem, na hora da prova, e tirar uma nota boa. Ou: se você fizer bem seu curso de inglês, vai levar vantagem na hora do vestibular, ou até mesmo na hora de arrumar um bom emprego.
É imoral ou antiético ser esforçado, para, com isso, obter bons resultados?
Claro que não.
Há que se olhar o caso sob esta outra ótica.
Estar ou levar vantagem sobre alguma coisa ou alguém, no mais das vezes, é uma coisa boa, fruto de um esforço ou trabalho, que o colocou em uma posição privilegiada em relação aos outros, que não se esforçaram tanto.

Assim, da próxima vez que alguém lhe perguntar se você gosta de levar vantagem, diga, com orgulho, que sim; se ele lhe considerar um mau caráter, provavelmente ele pertence àquele grupo para o qual “vantagem” e sinônimo de “safadeza”; pobre dele.

sábado, 6 de fevereiro de 2016

A SABEDORIA DA NATUREZA




A SABEDORIA DA NATUREZA

Há um adágio popular que diz: “A natureza é sábia”. E é mesmo!
E nós poderíamos ser também, se a observássemos com mais atenção, aprendendo com ela e a imitando.

Não acredita?
Fernando Pessoa, aborda bem esta situação em um de seus poemas: “... isso é talvez ridículo aos ouvidos de quem, por não saber o que é olhar para as coisas, não compreende quem fala delas, com o modo de olhar que reparar para elas ensina...”.

A água nos dá um bom exemplo da sabedoria da natureza; ao se defrontar com um obstáculo, não tenta enfrenta-lo, nem discutir com ele; apenas o contorna e segue seu caminho, serena.

Em quantas situações da vida cotidiana, não poderíamos agir da mesma forma que a água, sem estresse, sem conflitos, contornando os obstáculos e seguindo serenos, deixando-os para trás, sem que interfiram em nossas vidas?

E quantos exemplos dessa sabedoria da natureza vemos no Aikido? Inúmeros. Quando aplicamos um Koshi Nague, por exemplo, deveríamos fazê-lo como uma onda arrebentando sobre um rochedo.
Mitsug Saotome escreveu um fantástico livro intitulado “O Aikido e a Harmonia da Natureza”, onde trata, de forma quase poética, esta relação entre o Aikido e a sapiência da natureza.


No Aikido, como na vida, deveríamos tirar mais proveito dessa sabedoria que está ao alcance de todos.

terça-feira, 26 de janeiro de 2016

MUSUBI



MUSUBI


As filosofias orientais, principalmente aquelas baseadas no Taoismo, identificam duas energias essenciais: Yang e Yin. Uma representa o positivo, a outra o negativo, uma o macho, a outra a fêmea, o sol e a lua, a força e a fraqueza, o ativo e o passivo, etc.

Acostumamo-nos a ver essas coisas como sendo opostas, muitas vezes em conflito entre si. Essas filosofias, porém, nos ensinam que, na verdade, essas coisas que vemos como opostas são, na realidade, complementares; uma não pode existir sem a outra; como se fossem os dois lados de uma moeda.

Cada um de nós traz, dentro de si, essas duas energias, em suas mais variadas formas; podemos usá-las como quisermos, mas o segredo consiste em não nos apegarmos a apenas a uma delas, tentando desprezar a outra: ser forte e não fraco, criativo e não destrutivo, ter amor e não ódio. O segredo consiste em aceitar o fluxo natural e constante de energia, que existe entre estes dois extremos.

A este fluxo de energia, dá-se o nome de MUSUBI. MUSUBI é o processo de unificação dos opostos. É energia em movimento, pois sem movimento, não pode haver  união. Seu símbolo é a espiral, a reciclar perpetuamente a própria energia.

O diagrama Tei-gi, que ilustra esta postagem e é o símbolo do Taoismo, define bem esta situação: Duas energias opostas, mas equivalentes; continuamente a girar, em perfeito equilíbrio; com dois pequenos círculos, mostrando que na luz há sombra e que na escuridão existe luz.

E esse fluxo de energia está em tudo: Em uma pilha, a energia deve fluir de um polo ao outro, para fazer funcionar o aparelho que a contém; o coração tem que alternar entre contração e relaxamento, para que possamos viver. Tudo é fluxo entre Yang e Yin; tudo é MUSUBI.

Mas, onde quero realmente chegar é à constatação da existência das energias Yang e Yin no Aikido. A maioria dos praticantes, embora utilizem um pouco dessas energias, não o fazem de forma consciente, não usufruindo de todo o poder que este fluxo de energia - MUSUBI- pode lhes proporcionar.

Vejamos um exemplo: Quando um atacante nos agarra pelo braço, ele o faz com força; está sendo Yang. Quando recebemos o ataque, devemos deixar o braço bem flácido, sendo Yin. Com isso, cria-se um fluxo de energia, pois encontrando um braço flácido, o atacante perde seu ponto de apoio e se desequilibra, passando imediatamente a ser Yin; neste exato momento, iniciamos a aplicação da técnica, já como Yang, assumindo o controle do conflito.

 Assim MUSUBI, este fluxo de energia, que passa de Yang a Yin e vice-versa várias vezes, talvez seja o “sal da terra”, o conceito mais básico e fundamental do Aikido; quase nunca lembrado, raramente mencionado, nunca ensinado.

Como sempre, o Aikido e a vida são a mesma coisa.

Quantas vezes uma mulher nervosa e irritada -Yang- não necessita apenas de um marido que a escute – Yin?
Quantas vezes uma filha rebelde e agressiva – Yang – não necessita apenas de uma família que lhe dê apoio – Yin?
E um amigo triste e deprimido -Yin - talvez necessite apenas de algumas palavras de conforto e apoio – Yang.


Assim deveria ser nosso Aikido; assim deveria ser nossa vida.