O KI E O AIKIDO
Existe em cada
um de nos uma energia vital que impregna nosso corpo e mente e que nos mantém
vivos e ativos. Uma energia que nos dá forças para a prática de atividades
físicas, ou pura e simplesmente executar nossas atividades diárias.
Para os
Japoneses, a energia se chama KI, para os chineses CHI, para os Indus PRANA, e
assim por diante.
Contudo, o
conceito oriental de KI, como sendo uma energia universal, não antropomórfica1,
livre e que permeia todas as coisas, o tempo todo, é de difícil compreensão
para nossa cultura ocidental, ou nossa formação científica. Através deste
conceito, esta energia emana das montanhas, das águas, florestas, etc.,
conceito este que, em antropologia, é conhecido como animatismo2.
Do ponto de
vista da física clássica, energia é qualquer coisa capaz de produzir força ou
trabalho (movimento). Assim, a energia eólica faz mover os moinhos, a energia
térmica faz mover as máquinas a vapor e assim por diante, até chegarmos à
digestão, em que o processamento dos alimentos fornece energia aos músculos,
produzindo força e movimento.
Ainda segundo
a cultura oriental, o kanji para a
palavra KI, é formado por dois elementos, um representando “arroz”, o outro
“vapor”. Isto remete à ideia de que o Ki estaria relacionado com o alimento
(arroz cozido). Sob a luz da ciência, a energia que movimenta o corpo é
proveniente da alimentação, que, pelo processo da digestão, converte o amido em
maltose, glicose, chegando, por fim a moléculas de Trifosfato de Adenosina –
ATP, que, juntamente com o oxigênio, obtido pela respiração, fornece a energia
necessária ao funcionamento das células. Desta forma, uma pessoa bem alimentada
e com regular capacidade muscular, é, consequentemente, dotada de muita
energia.
Isto, guardada
as devidas proporções, coincide, em parte, com a ideia original de KI, neste
caso não uma energia que se encontra em todas as coisas, mas pelos menos em
todos os seres fortes e bem nutridos.
O KI é um
conceito muito presente na prática do Aikido; eu diria até que é um dos fundamentos e um dos princípios
mais importantes desta Arte Marcial. Os praticantes de Aikido, estudam a energia
interna do corpo, que quando desenvolvida, expandida e corretamente direcionada,
através dos treinos e da prática constante, lhes permitiria controlar, de forma
mais satisfatória, seus oponentes, tornando suas técnicas mais elegantes, leves
e, conseqüentemente, eficientes.
Tentar praticar Aikido sem pensar em
desenvolver e aplicar esta energia, acabaria transformando o praticante num
mero executor de técnicas, fazendo-as de modo mecânico e ineficiente. No
outro extremo, um praticante que se preocupa excessivamente em desenvolver e
controlar esta energia, dando pouca atenção à técnica, acabaria por acreditar que
poderia imobilizar ou controlar seus oponentes apenas com sua energia,
praticamente sem contato físico. Nenhum dos extremos caracteriza a boa prática
do Aikido. Um conceito do Taoísmo nos ensina que a verdadeira sabedoria consiste
em seguir o “caminho do meio”, afastando-nos dos extremos.
Então, se
todas as pessoas são dotadas de muita energia, o que diferencia uma pessoa
normal do praticante avançado de Aikido, de quem se diz ter expandido seu KI e
consegue, com esta energia, facilidade e eficiência na aplicação das técnicas?
Isso não só
para o Aikido, mas para qualquer outro atleta que se sobressai de maneira
brilhante em seu esporte.
Eu faria uma
comparação grosseira do KI com a luz! A luz é formada por ondas
eletromagnéticas, que se propagam no espaço. Sob este ponto de vista, uma
pessoa normal, ou um iniciante em Aikido, seria igual a uma lâmpada; embora
dotado de bastante energia, sua luz (ou as ondas eletromagnéticas) se propaga
aleatoriamente em todas as direções. Já um praticante avançado, seria igual a
um raio laser, onde as ondas eletromagnéticas não mais se propagam ao acaso,
mas são agrupas e direcionadas em um único feixe de luz, com uma eficiência incrível.
A título de exemplo, uma lâmpada de 100 W é capaz de iluminar satisfatoriamente
uma sala pequena; um laser de 100 W tem uso militar, com capacidade de
destruição muito grande.
Pense em um
lançador de dardo; no momento do arremesso, toda sua energia está concentrada
no ato de arremessar o dardo com força e na direção correta; daí vem os recordes.
Certamente,
qualquer que seja a atividade, o caminho exige muito treino; no Aikido não mais
executar a técnica de forma mecânica, tentando apenas imitar os movimentos do
Sensei, mas mudando o enfoque da prática, dando mais ênfase ao controle da
respiração durante sua aplicação, à energia envolvida na técnica, tentando
direcioná-la no sentido do esforço do oponente e não mais tentando aplicá-la
onde você havia planejado.
Mas não é só
na prática de artes marciais ou esportes que esta energia pode ser utilizada;
em qualquer das atividades do dia a dia, conseguir focar suas energias em um
determinado trabalho, concentrá-la em alguma atividade, fará com que os
resultados obtidos superem as expectativas e se tornem mais fáceis e
eficientes.
Em resumo: O
Ki está dentro de nos! Encontrá-lo e desenvolvê-lo depende de nossa capacidade
de seguir o Caminho, desenvolvendo nosso auto conhecimento e direcionando nossa
energia para usá-la de forma mais efetiva.
Finalizando,
vale citar as palavras do Sensei Mitsug Saotome:
“ O
treinamento para desenvolver um Ki forte, não é o treinamento do Caminho; que o
Ki seja forte ou fraco é irrelevante, pois o forte pode ser mau e o fraco bom.
A única característica a ser buscada no KI, a única realmente importante é a
pureza.”
[1] -Antropomorfismo é uma forma de pensamento que atribui características ou
aspectos humanos a Deus,
deuses, elementos da natureza, animais e constituintes da realidade em
geral.
2
- Animatismo - A mais primitiva das
concepções sobrenaturais, atribui a todas as pessoas, animais e coisas
que existem uma entidade sobrenatural que as anima e controla. O termo foi
introduzido por Marrei (1866-1943).
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